
“Todo mundo tem duas vidas. A segunda começa no momento em que você descobre que só tem uma.” Impossível não começar a falar dessa HQ por essa citação que resume tão bem a trama do livro e nos faz imediatamente refletir sobre as nossas existências.
Já tem um tempo que eu venho, com perdão do meu linguajar rebuscado, babando o ovo da Editora Nemo e em boa parte por causa de títulos como esse, que, se não fosse por eles, possivelmente jamais seriam publicados por aqui. Duas Vidas é mais um na sucessiva linha de acertos dessa editora que merece a sua atenção.
A trama é bem simples: um sujeito que leva uma vida muito regrada sem qualquer extravagâncias, descobre que tem um câncer terminal. Influenciado pelo irmão – seu oposto completo em personalidade – resolve largar tudo e viver seus últimos dias livre das suas preocupações antigas e se arriscando um pouco mais.
O que poderia parecer uma história sombria e deprê, gera uma trama leve, com diálogos interessantes, momentos divertidos e, ainda que triste em algum aspecto, com direito a um final feliz. Mais importante do que te levar do ponto A ao ponto B, esse miolo é a essência do livro, te apresentando personagens verdadeiros, lugares reais, que te deixam com a sensação de ter vivido aquela jornada de um jeito muito pessoal.
Aliás, o autor intercala cada capítulo com um flashback de algum momento pessoal e marcante do passado do protagonista, que nos ajuda a entender melhor sobre a sua vida e suas motivações.
Tudo isso é feito com o brilhante uso das cores (os flashbacks tem um leve ar “amarelado”, enquanto o presente possui um tom mais duro, documental). A arte é simples e genial. Como adepto nítido da linha clara belga que criou o Tintin, Fabien Toulmé consegue muito com muito pouco, criando expressões e locações com nada além do necessário. Parece que os quadrinhos tomam vida e viram animação na sua frente.
Essa é uma excelente recomendação pra quem precisa de uma pausa do estrionismo super heróico, ou pra quem acha que os quadrinhos são sempre a mesma coisa.
Vamos a algumas vantagens e desvantagens:

- Saiu no Brasil, pela Editora Nemo, que tem excelente entrada em livrarias, então não deve ser nada difícil achar por aí
- Arte linda
- História comovente
- MAS SEM SER TRISTE PRA C%¨%$¨LHO! (Acho isso importante, não suporto história deprê, foi mal)
- Um volume só. Comprou, leu, completou. E provavelmente você vai querer ler de novo.
- Leitura rápida e fluida

- Se você espera que alguém atire raio laser dos olhos, esse talvez não seja o quadrinho para você
- Para algumas sutilezas é importante entender as diferenças culturais entre nós e os franceses e belgas. Coisas que para nós não são nada demais, para muitos por lá são motivos de enrubescimento (uau, escrevi essa palavra achando que o corretor ia acusar e, pra minha surpresa, ela existe mesmo!)
Quadrinhos podem ser uma maravilhosa ferramenta de reflexão! Você não acha?